“Como posso eu, criatura miserável, continuar usando uma coroa de dignidade terrena quando vejo o meu Rei Jesus Cristo, coroado de espinhos? ”.
A princesa que se dedicava aos pobres
Ana Carolina Miranda, OFS
Aproxima-se o dia em que celebramos a festa de Santa Isabel da Hungria, ou da Turíngia – 17 de novembro. Santa Isabel desperta muita curiosidade em diversas pessoas por ter sido princesa e ser a padroeira dos franciscanos seculares. Parece incoerente, não é mesmo? Uma Ordem que se propõe a viver os valores evangélicos basilares de Francisco e Clara de Assis, em seu estado laical, ter como patrona alguém que usou uma coroa e não parece, a princípio, ser modelo de simplicidade…
Ao nos debruçarmos sobre a história de Isabel, no entanto, descobrimos uma jovem de valores profundamente cristãos, enraizados no Evangelho, e que também se encantou pelo seguimento de Francisco, ainda na Idade Média. Seu pai era André II, rico e poderoso rei da Hungria. Para reforçar os laços familiares, o soberano havia se casado com uma condessa alemã, Gertrudes de Andechs-Merania, irmã de Santa Edwiges, que era esposa do duque da Silésia. Era um ambiente de nobres e dos grandes da terra, de reis e rainhas, duques e duquesas, príncipes e princesas.
Isabel nasceu em 1207 e, antes de completar a primeira década de vida, perdeu a mãe. Viveu na corte húngara apenas nos primeiros anos de vida com uma irmã e três irmãos. Foi prometida em matrimônio pouco depois de seu nascimento, num período em que os enlaces aconteciam como acordo entre nações. Sua infância foi interrompida quando cavaleiros vieram buscar a menina para levá-la para a Alemanha central. Seu pai havia determinado que ela viesse a se tornar princesa da Turíngia (estado no centro-oeste da Alemanha).
Isabel partiu de sua pátria com grande cortejo para servi-la e um dote bastante considerável. Com ela foram suas duas amas pessoais que, no decorrer do tempo, puderam fornecer informações preciosas a respeito da vida de Isabel. Ambas talvez fizessem parte, mais tarde, do núcleo do que viria a ser a Terceira Ordem Franciscana. Após uma longa viagem, chegaram a Eisenach, para depois subir à fortaleza de Wartburg, o maciço castelo sobre a cidade. Lá se celebrou o compromisso, bastante sóbrio, vale destacar, entre Ludovico e Isabel, quando a jovem tinha apenas 14 anos. Nascida em um país cheio de sol e abundância, como era a Hungria, foi morar na então dura e pobre Germânia. A pobreza do povo mexeu ainda mais com a caridade da princesa Isabel.
Nos anos seguintes, enquanto Ludovico aprendia o ofício de cavaleiro, Isabel e suas companheiras estudavam alemão, francês, latim, música, literatura e bordado. Apesar do compromisso entre eles ter sido assumido por razões políticas, ali nasceu um amor sincero, motivado pela fé e pelo desejo de fazer a vontade de Deus. Após a morte de seu pai, aos 18 anos, Ludovico começou a reinar e Isabel tornou-se objeto de críticas silenciosas no ambiente da corte. Seu comportamento sóbrio não correspondia aos costumes vigentes. Definitivamente, não gostava das obrigações sociais decorrentes do fato de ser uma princesa. Não consumia alimentos sem antes ter a certeza de que eles provinham de propriedades e bens legítimos do marido e nem queria se alimentar daquilo que, de alguma forma, proviesse de injustiças, do aproveitamento do trabalho não recompensado.
Conta-se que certa vez tirou a coroa da cabeça e prostrou-se por terra. Uma religiosa teria visto o gesto e Isabel deu a seguinte explicação: “Como posso eu, criatura miserável, continuar usando uma coroa de dignidade terrena quando vejo o meu Rei Jesus Cristo, coroado de espinhos? ”. Fato curioso e bonito na biografia de Isabel.
Praticante assídua das obras de misericórdia, dava de beber e de comer a quem batia à sua porta, distribuía roupas, inclusive as suas, e também joias… Pagava as dívidas de quem não as podia pagar, cuidava dos doentes e sepultava os mortos. Descendo de seu castelo, dirigia-se frequentemente com suas amas às casas dos pobres, levando pão, carne, farinha e outros alimentos. Entregava pessoalmente os alimentos e cuidava com atenção do leito e das roupas dos pobres. Este fato chegou aos ouvidos do marido, ao que ele respondeu: “Enquanto ela não vender o castelo, estou feliz”. Importante lembrar o milagre do pão transformado em rosas: enquanto Isabel ia pela rua com seu avental cheio de pães para os pobres, encontrou-se com o marido, que lhe perguntou o que estava carregando. Abrindo o avental, no lugar dos pães, apareceram rosas. Este símbolo da caridade está presente muitas vezes nas representações em pintura e em imagens de Isabel.
A princesa caridosa amava o marido e ele era reconhecido pelo amor da esposa e o retribuía. O jovem casal encontrou apoio espiritual nos Frades Menores, que, desde 1222, difundiram-se na Turíngia. Entre eles, Isabel escolheu Frei Rüdiger como diretor espiritual. Quando ele lhe narrou as circunstâncias da conversão do jovem e rico comerciante Francisco de Assis, Isabel se entusiasmou ainda mais em seu caminho de vida cristã. Desde aquele momento, dedicou-se ainda mais a seguir Cristo pobre e crucificado, presente nos pobres, tornando-se uma grande franciscana. Inclusive depois que nasceu seu primeiro filho, seguido de outros dois, Santa Isabel não descuidou jamais de suas obras de caridade. Ajudou os frades a construírem um convento em Halberstadt.
Seu marido, em 1227, juntou-se à cruzada de Frederico II, dizendo à esposa que era uma tradição dos soberanos da Turíngia. Ludovico morreu antes de embarcar, dizimado pela peste, em Otranto, aos 26 anos. Isabel sofreu muito quando soube da notícia e passou então a dedicar-se mais às coisas do reino. Seu cunhado usurpou o governo da Turíngia, tornando-se sucessor de Ludovico, acusando Isabel de incompetência para gerir os assuntos do governo. A jovem viúva, com seus três filhos, foi expulsa do castelo de Wartburg e começou a procurar um lugar para refugiar-se. Conta-se que Isabel chegou a abrigar-se num curral de porcos com os filhos até ser socorrida como pobre pelos franciscanos, uma vez que até mesmo os mendigos e enfermos ajudados por ela insultavam-na por temerem desagradar o rei regente.
Peregrinando pelos povoados, Isabel trabalhava onde era acolhida e assistia os doentes, fiava e costurava. Durante este calvário, suportado com grande fé, paciência e dedicação a Deus, alguns parentes, que haviam permanecido fiéis a ela e consideravam ilegítimo o governo de seu cunhado, reabilitaram seu nome. Isabel recebeu algumas rendas e pode retirar-se para o castelo da família em Marburgo, onde vivia também seu então diretor espiritual, Frei Conrado. Em 1228, com as mãos sobre o altar da capela dos franciscanos em Eisenach, Isabel renunciou à própria vontade e às vaidades do mundo, entrando para a Ordem Terceira de São Francisco.
Construiu depois um hospital para leprosos e viveu os três últimos anos de vida no hospital cuidando dos doentes e acompanhando o término da vida dos moribundos. Fazia trabalhos humildes e repugnantes, servindo os enfermos até morrer, em 1231. Mulher de oração e generosa, em meio aos sofrimentos Isabel sempre era em tudo socorrida por Deus. Ela faleceu com apenas 24 anos, no hospital construído com os seus próprios bens.
Depois de conhecer mais a fundo a vida e o testemunho de Isabel, é possível entender o porquê de ela ser a padroeira dos franciscanos seculares. Que o coerente e engajado exemplo dela nos motive a concretizar, na realidade onde estivermos inseridos, os valores do Evangelho do Cristo pobre, humilde e crucificado!






![Santa Inês de Assis<a href="#_ftn1" id="_ftnref1">[1]</a>](https://ofm.org.br/wp-content/uploads/2025/11/santa-ines-de-assis-copiar-330x242.jpg)