Celebração Eucarística de abertura do Capítulo Provincial 2024

Celebração Eucarística de abertura do Capítulo Provincial 2024

A Fraternidade Provincial escolheu se debruçar ao mesmo tempo sobre temas tão amplos e tão fundamentais ao seguimento de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Paz e bem!

Hoje, partilhamos a homilia do visitador, Frei Gustavo Wayand Medella, ofm, que durante a celebração Eucarística na noite de abertura dos trabalhos do Capítulo Províncial da Província Santa Cruz, nos convidou a refletir sobre o tema do Capítulo: Vocação: Testemunho, acolhida e acompanhamento do frade menor diante dos desafios sócio-eclesiais”.

Que suas palavras nos inspire e nos guie para uma vida de paz e comunhão com Deus e com nossos irmãos.

Acompanhe a homilia na íntegra:

Vocação: Testemunho, acolhida e acompanhamento do frade menor diante dos desafios sócio-eclesiais”.

Entrego-te meu povo: para edificar, destruirás e plantarás. (Jr 1,10).

Estimados irmãos da querida Província Santa Cruz, paz e bem! Relendo e meditando o tema e o lema deste Capítulo, percebi a diversidade de conceitos e reflexões que ambos propõem. É, de fato, grande ousadia da Fraternidade Provincial escolher se debruçar ao mesmo tempo sobre temas tão amplos e tão fundamentais ao seguimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. Sob a luz da Liturgia da Palavra proposta para hoje, gostaria de, brevemente, mencionar cada um destes conceitos, tentando buscar, no que eles significam, algumas pistas que qualifiquem nossa participação nesta assembleia capitular.

Vocação

Tem na sua raiz as palavras “voz” e “chamado”, uma “voz que chama”. A voz do Pai que, no Espírito Santo, convocou-nos ao seguimento do Filho. A voz que nos legitima na liberdade de filhos amados de Deus. Voz mais forte e potente que a de Jonas, capaz de converter os ninivitas. Voz nem sempre ouvida e acolhida quando dispersamos nossa atenção em busca de sinais ilusórios e passageiros como aqueles buscados pelos contemporâneos de Jesus. Nesta altura do campeonato, não devemos mais trazer dúvidas sobre nosso chamado. Mesmo com limites e inconsistências, o Senhor nos chamou e continua a nos chamar. Sem distração, queremos seguir respondendo: “Aqui estamos”!, cada um e todos, seres únicos que escolheram se fazer irmãos no Irmão Jesus Cristo. 

Testemunho

Palavra cuja origem desperta algumas controvérsias entre os estudiosos da etimologia. Chamou-me a atenção o dado de que as palavras “testemunha” e “testículo” têm a mesma raiz e que, na Roma antiga, os juramentos importantes eram feitos com a mão direita postada sobre a própria parte íntima. A interpretação nos ajuda a perceber o grau de seriedade e compromisso com que devemos assumir nosso testemunho cristão e franciscano, como palavra e ação que expressam com clareza uma verdade, a verdade do Evangelho, de que pertencemos a Cristo.

Acolhida

Tem relação com a colheita, momento de gratidão, extravasamento da vida, ocasião de alegria partilhada na fartura do que se colhe e se torna alimento à mesa, possibilidade de retomada do vigor. Fomos colhidos por Deus no solo familiar onde estávamos plantados e recolhidos no mesmo celeiro, acolhidos no mesmo armazém: a Vida Religiosa Franciscana. Ninguém é intruso ou estranho: todos somos filhos da colheita e da acolhida generosas de Deus e a única resposta que podemos dar a este gesto de amor total é a de sermos acolhedores uns com outros e para com todos que o mesmo Deus coloca em nosso caminho.

Acompanhamento

Mais uma vez a mesa se faz presente. Companheiro é aquele com quem me disponho a repartir o pão ou quem está disposto a repartir o pão comigo. Acompanhar significa gastar tempo, dispor-se a comer o pão na mesma mesa dia após dia. Pão macio e saboroso, às vezes pão duro e ressequido, dando o melhor de si e prestando atenção para que o pão jamais fique embolorado pela indiferença, pela rivalidade, pelo ódio. Todos precisamos ser acompanhados. Ninguém suporta ser ou achar-se perseguido. Quem se sente acompanhado, sente-se conduzido por Deus, que jamais abandona seus filhos e filhas, e consegue cantar com o salmista: “Do nascer do sol até o seu ocaso, louvado seja o nome do Senhor”.

Desafios sócio-eclesiais

Na raiz latina, desafio tem a ver com a fé. São fatos ou realidades que podem nos levar a desviar da fé. Desta maneira, seria como o balançar vigoroso de um barco diante das investidas do mar revolto numa tempestade, semelhante àquela enfrentada por Jonas, personagem mencionado por Jesus no Evangelho que ouvimos. O desafio coloca em cheque o chão onde pisamos, causa desconforto, mal-estar e insegurança. Por outro lado, permite-nos avançar na profundidade de nossas opções. As raízes das árvores se tornam mais profundas e firmes à medida que a força dos ventos as balança. Secularismo, capitalismo, individualismo, polarização, degradação ambiental, alienação, clericalismo, violência, moralismo, relativismo, guerras entre outros tantos desafios têm colocado em cheque nossa opção de fé. Abraçar com maior clareza e entusiasmo os valores fundamentais de nossa vocação segue sendo a grande possibilidade de superarmos todas estas intempéries.

Para edificar: destruirás e plantarás

Quanto ao lema da inspiração bíblica. Nasceu de uma canção vocacional baseada na Profecia de Jeremias. À princípio pode até causar choque o uso do verbo “destruir”. No entanto, ele dever ser compreendido à luz da finalidade que o antecede: para edificar. Diante de tantos desafios, talvez precisemos da ousadia dos missionários holandeses que aqui chegaram. Certamente precisaram derrubar dentro de si uma série de conceitos e respostas prontas que possuíam dentro de si a partir da realidade em que viviam. Com generosidade e coragem, começaram a plantar uma nova história de evangelização, atentos aos novos desafios que tinham pela frente: um novo lugar, um novo povo, um novo idioma, uma nova realidade. Quem planta, o faz com paciência, pois sabe que o crescimento de uma árvore é bem mais lento que o levantar de uma parede. Nesta disposição de mudar o que precisa ser mudado, de responder com coragem aos desafios de nosso tempo é que queremos celebrar este capítulo.

Inspirados na célebre canção “Timoneiro”, imaginando o Espírito Santo como grande mar onde estamos adentrando com nossa canoa, tenhamos a coragem e a lucidez de afirmar: “Não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar”. Nestes dias, não somos nós quem vamos nos dirigir, mas Deus é quem nos dirigirá. Amém.

Santos Dumont, 14 de outubro de 2024.

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