“Ao longo da Quaresma, preparamo-nos para renovar na noite de Páscoa a consagração batismal, que marcou a decisão fundamental da nossa vida, aquela por Cristo Senhor, crucificado e ressuscitado”.
A todos os Frades Menores
A todas as Irmãs Clarissas
A todas as Irmãs Concepcionistas
Às leigas/leigos franciscanos
Alverne, 9 de abril de 2022
Caros Irmãos e Irmãs,
O Senhor vos dê a paz!
Este ano é impossível esperar e celebrar a Páscoa esquecendo de tudo o que está acontecendo no mundo. A guerra na Ucrânia é terrível por causa do quanto aquele povo está sofrendo e da ameaça que representa para toda a humanidade.
Ao mesmo tempo, obriga-nos a ver a realidade de tantos conflitos no mundo, como na Etiópia e na Somália, no Sri Lanka, no Mianmar, no Iêmen, no Haiti, em Cuba, na Síria, no Afeganistão, no Congo, na Nigéria e ainda em outras partes, infelizmente. Em vários desses lugares também estamos presentes. Não posso me esquecer do Mediterrâneo, que há muito tempo é lugar de morte para muitos.
Este meu desejo de feliz Páscoa quer nos ajudar a reconhecer que dentro dos apertos da história passa a Páscoa do mundo. Quero dizer que a luta entre a energia da Ressurreição e as forças que a querem anular é sempre muito forte. E não podemos ficar neutros nesse tipo de combate.
Ao longo da Quaresma, preparamo-nos para renovar na noite de Páscoa a consagração batismal, que marcou a decisão fundamental da nossa vida, aquela por Cristo Senhor, crucificado e ressuscitado.
É sempre necessário fazer memória de que fomos comprados por alto preço e, portanto, a quem pertencemos. Contemporaneamente recordamos que todo homem, toda mulher, e toda criatura, inseridos misteriosamente na Páscoa do Senhor, vivem os apertos da história, gerando aquela humanidade de Cristo que venceu o pecado e a morte para doar-nos a plenitude da Vida. É a Páscoa, o Cordeiro imolado e glorioso, a última e decisiva palavra da história, e não a força das armas, ainda que fossem as mais destruidoras.
No último 25 de março, o Papa quis confiar, ou melhor, consagrar toda a humanidade, e especialmente a Rússia e a Ucrânia, ao coração da Mãe, a Virgem Maria.
Parece-me que este “ato espiritual”, como o Papa Francisco o definiu, recorda-nos antes de tudo que o cosmos e a história pertencem a Deus. Restituamos todos os bens ao Senhor Deus, de quem procedem todos os bens!
Renovemos, então, a nossa pertença ao Onipotente e Bom Senhor, enxertados em Cristo Senhor.
Convidemos todas as criaturas a louvar e bendizer o Altíssimo!
Esse ato recordou-nos que somos criaturas e, portanto, filhos do Pai celeste, irmãos e irmãs em Jesus Cristo, na luz do Espírito, e não dominadores de nossos próprios semelhantes. Irmãos e menores, em suma!
Um ato realizado no coração da Mãe, que estava junto à cruz, como diz o Evangelho de João.
Do mesmo modo, junto à cruz imensa que hoje aflige a Ucrânia e tantos países do mundo, está a mãe.
A presença de Maria, a Virgem feita Igreja que «fez com que se tornasse irmão nosso o Senhor da majestade » (Legenda Maior IX, 3), é inerente à nossa consagração batismal e à nossa profissão.
Com efeito, assim como Maria foi discípula fiel do seu Filho até a cruz e na espera plena de fé na ressurreição, também nós, com ela e por sua intercessão, podemos crescer como discípulos, testemunhas e anunciadores da Páscoa.
Está a mãe: ao lado de muitas mães e pais forçados a sepultar seus filhos nesta guerra hedionda, e em tantas, em muitas outras circunstâncias e partes da terra.
Está a mãe: ao lado daqueles que clamam ao céu, procurando, muitas vezes com dificuldade, os vestígios da presença de Deus nesta vida. E está ao lado também de quem não consegue mais clamar e procurar.
Está a mãe: ao lado daqueles que, embora batizados, levantam sua mão sacrílega contra outros cristãos e não somente contra esses. Ao lado daqueles cristãos que não sabem tomar posição diante do horror da guerra, que é sempre injusta e sem retorno, e não sabem dizer palavras do Evangelho nesta hora.
Está a mãe: ao lado de quem, como um paciente artesão, tece todos os dias a paz, acolhendo os pequenos, os refugiados, os emigrantes, construindo pontes e não muros. Ao lado de quem vive em toda a parte do mundo as consequências de um empobrecimento crescente, da mudança climática, do fosso entre ricos e pobres e da incerteza acerca do futuro. E ao lado de quem se dedica, de muitas maneiras, à solidariedade em favor de tantos.
Está a mãe: ao lado de quem persevera na oração contínua a fim de reconhecer e acolher a presença do Cristo crucificado e ressuscitado nesta hora trágica, consolando-o naquela dor com a qual a insensatez da violência ainda o traspassa: O Amor não é amado! A humilde oração do Rosário, na memória orante do Evangelho e em companhia de muitas pessoas simples e pobres, seja a voz que suplica a Maria a intercessão junto de Deus, para que toque os corações endurecidos que investem contra a paz no mundo.
Está a mãe: ao lado de tantos frades menores, irmãs franciscanas e leigos que permanecem nos lugares em que há guerras, consolando e sustentando a esperança; ao lado também de quem acolhe muitas pessoas que fogem dos conflitos.
Está a mãe: também ao lado dos povos do Oriente Médio, que sofrem as consequências de conflitos nunca resolvidos; ao lado dos cristãos e de nossos frades que celebram o mistério da Páscoa em Jerusalém e nos Lugares Santos. Permaneçamos também ao lado deles, sustentando-lhes a presença e a missão, de modo especial com a Coleta da Sexta-Feira Santa, para com a qual vos peço o devido cuidado também neste tempo.
Está a mãe: considero que precisamos redescobrir a presença de Maria junto à nossa vida.
Maria nos conduz sempre a Cristo Senhor e aos seus e nossos irmãos, sem distinções.
Maria nos indica o caminho da conversão e da penitência, que são Francisco e santa Clara acolheram como novo início, a fim de que a paz comece em cada um de nós e, assim, irradie-se em muitos.
Maria, que permaneceu junto à cruz e esperou a alegria da ressurreição, ajuda-nos a não virar a cabeça noutro lado, mas a viver até o fim este momento amargo da humanidade, para que esse seja transformado pela doçura da Páscoa de Cristo, o centro do mundo e o Senhor da história que reina a partir da cruz.
Imbuído desses sentimentos, daqui, do Santuário do Alverne, o Calvário franciscano, enquanto se concluem os Exercícios Espirituais dos Definidores Gerais das nossas quatro Famílias Franciscanas, desejo a todas e todos uma verdadeira Páscoa, capaz de nos doar a alegria da Ressurreição, sacudindo-nos e convertendo-nos de uma vida cristã demasiado morna e resignada.
O Senhor reavive em nós o amor por Ele, através da paixão pela vida dilacerada de tantos, pela esperança de muitos, de modo especial dos jovens, pela justiça e a reconciliação de todos.
Com a benção de São Francisco, desejo sinceramente a todos uma serena Páscoa da Ressurreição.
Vosso irmão e servo
Fr. Massimo Fusarelli, OFM
Ministro geral