Festa de Todos os Santos da Ordem Franciscana

Festa de Todos os Santos da Ordem Franciscana

A festa de todos os Santos da Ordem Franciscana nos recorda que todos nós somos chamados a santidade, mas de um modo muito especial no seguimento e na tradição espiritual de Francisco de Assis.

Assim, ele capacitou os santos para a obra do ministério (Ef. 4,12)

Frei Eduardo Vely de Mesquita, OFM

No Evangelho de Mateus Jesus faz um convite a sermos santos como o Pai do Céu é Santo.[1] Com estas palavras Jesus propõe, a comunidade cristã, um projeto no qual somos convidados a nos configurarmos ao Pai. Em outras palavras, somos convidados a recuperar a nossa imagem e semelhança com Deus. Imagem e semelhança que foram perdidos pelo pecado, pela soberba, pela inveja e pelo ódio. Contudo nós sabemos que algumas pessoas alcançaram este caminho de perfeição. Eles se espoliaram de toda concupiscência e se toram “amigos de Deus”; a estes nós chamamos santos!

A Igreja professa que os santos estão ao nosso lado como auxiliadores e exemplos de vida, pois eles estão totalmente juntos de Deus, e Deus está totalmente junto de nós através de seu Filho Jesus Cristo que é o sumo pontífice entre eles e nós que ainda trilhamos o nosso caminho individual de aperfeiçoamento. Assim nós, pecadores, estamos em comunhão com os santos, pois o próprio Senhor Jesus é quem nos garante esta união. Nós e eles, pois o amor de Cristo nos uniu!

Para recordar que somos unidos pelo propósito comum de alcançar a santidade, a Igreja celebra no primeiro mês de novembro a Festa de Todos os Santos. Esta bela liturgia reforça em nós que a vida cristã é chamada a santidade. 

A Ordem Franciscana, em consonância com a liturgia universal da Igreja, estabeleceu para si um dia próprio para recordar todos os Santos da Ordem Seráfica. A data escolhida é o dia 29 de novembro de cada ano. Esta data não é fruto do acaso, mas este mesmo dia recorda um fato muito significativa na vida de Francisco de Assis e de todos os seus irmãos e irmãs.

A CONFIRMAÇÃO DA REGRA FRANCISCANA

A vida de São Francisco foi profundamente marcada pela intuição e por aquilo que o Senhor lhe havia revelado através dos irmãos, das escrituras, da oração e contemplação. Dessa forma quando Francisco se dirige a cidade de Roma em 1209 para pedir a aprovação de seu Modo de Vida, ele e seus companheiros levam consigo um rascunho que continha mais citações bíblicas do que um texto legislativo. O Santo de Assis se apresenta diante do Papa Inocêncio III “e lhe pediu que confirmasse a Regra que havia escrito com palavras simples e usando expressões do santo Evangelho, pois aspirava plenamente à perfeição, o Senhor Papa, vendo-o tão fervoroso no divino serviço e fazendo uma comparação entre a sua visão e a parábola que o homem de Deus lhe havia contado, começou a refletir: “Na verdade, este é o homem religioso e santo, por meio do qual a Igreja de Deus será levantada e sustentada”. E assim abraçou-o e aprovou-lhe a Regra que havia escrito”.[2]

Sendo assim aquela Regra orientou e conduziu os primeiros companheiros de São Francisco. Contudo o grupo não parava de crescer e novas exigências foram surgindo no meio do caminho. Por este motivo urgiu a necessidade de uma regra mais elaborada e que pudesse contemplar a vida de todos os frades de uma maneira mais universal. Sabemos que aquela primeira Regra inicial foi sendo aprimorada e incluso com a ajuda dos irmãos. Francisco mesmo responde a um provincial dizendo que suas dúvidas a respeito da observância da Regra seriam discutidas no capitulo anula de Pentecostes; ali seriam debatidas com a ajuda do Espirito Santo e dos irmãos.[3]

Por isso Francisco se dirige novamente ao Papa para receber a chancela de que o propósito de vida dos irmãos estava em conformidade com os desígnios do Senhor e da Igreja. A Legenda Maio diz que “quando a Ordem já estava expandida, [Francisco] quis que a forma de vida aprovada pelo senhor Inocêncio fosse confirmada para sempre por seu sucessor Honório, pois foi animado para isso por uma revelação de Deus”.[4] “E conseguiu que fosse confirmada, como desejara, pelo supradito senhor Papa Honório, no oitavo ano de seu pontificado. Quando exortava fervorosamente os frades a observá-la, dizia que nada tinha colocado de sua cabeça, mas fizera escreve-la como fora divinamente revelada”.[5]

Assim a Regra definitiva da Ordem dos Frades Menores foi confirmada em 29 de novembro de 1223 através da bula papal “Solet annuere”. Este evento marcou profundamente a vida de toda a Ordem Franciscana. Motivo pelo qual foi escolhido também para celebrar a festa de Todos os Santos da Ordem Seráfica.

UM PROPÓSITO DE VIDA E UM CAMINHO DE SANTIDADE

Como acabamos de ver, a data da Festa de todos os Santo Franciscanos foi escolhida justamente na data da aprovação final da Regra. Contudo essa escolha não é fruto de apenas de um evento histórico, mas de uma teologia mais profunda. Isso se dá justamente porque a Regra de São Francisco se propõe ser itinerário de santidade.

O texto da Regra inicia confirmando a vocação evangélica de todos os Franciscanos e Franciscanas dizendo: “A Regra e vida dos Frades Menores é esta, a saber: observar o santo Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo vivendo em obediência, sem nada de próprio e em castidade”.[6]  Isso significa que a vida de Jesus (o Evangelho) é o grande modelo de nossa vida. Sendo assim, seguir a Regra Franciscana é se configurar com a vida do Filho de Deus. Ou em outras palavras ela propõe um itinerário para seguir a Cristo, caminho, verdade e vida.[7]

Dessa forma, a Regra Franciscana propõe um caminho de discipulado e ser discípulo não é outa coisa que ser um imitador do mestre. Deixando casas, famílias, riquezas e poder. Buscando a pobreza e humildade de espirito. Isso tudo com perseguições e desprezo, mas abraçando as “bem-aventuranças”[8] que conduzem ao paraíso. 

Em seu leito de morte, São Francisco, orienta os frades a viverem a Regra com fervor e devoção. Para estes o Santo dedica uma benção especial dizendo: “E todo aquele que as observar seja no céu cumulado com a bênção do altíssimo Pai, e seja cumulado na terra com a bênção de seu dileto Filho em unidade com o Espírito Santo Paráclito, com todas as virtudes do céu e todos os santos. E eu, Frei Francisco, o menor de vossos servos, vos confirmo, quanto posso, interior e exteriormente, esta santíssima bênção. Amém”.[9]

CONCLUINDO

A festa de todos os Santos da Ordem Franciscana nos recorda que todos nós somos chamados a santidade, mas de um modo muito especial no seguimento e na tradição espiritual de Francisco de Assis. A Regra Francisca é para nós este itinerário que aponta para o Filho de Deus Encarnado e ensina como chegar até a perfeição da caridade.

A grande beleza desta festa reside justamente na universalidade de seu chamado, pois todos nós fomos convidados por Jesus a sermos Santos como o Pai do céu é Santo. Todos nós somos chamados a trilhar o caminho de Francisco que indubitavelmente leva até a gloria da ressureição.

Para concluir relatamos uma pequena história que nos motiva a permanecer fiéis ao nosso chamado ao discipulado e a santidade. No capitólio XX do “fioretti de São Francisco”[10] narra que um jovem frade havia tomado para si um horroroso asco a pobreza do habito franciscano. Por isso ele decidiu abandonar a Ordem Franciscana. Em sua última noite no convento ele teve uma visão do paraíso onde viu uma multidão vestida com os mais ricos tecidos e ornamentos. De todos resplandecia uma luz que iluminava tudo. Quando o jovem frade criou coragem para interrogar quem eram aqueles que habitavam o paraíso, obteve a seguinte resposta: “Saiba, filho, que nós todos somos frades menores, que chegamos agora da glória do paraíso. […] E estas vestes de tecidos tão bonitos que usamos, foram dadas por Deus em troca das ásperas túnicas nós usávamos pacientemente na religião. E a gloriosa claridade que vês em nós foi-nos dada por Deus pela humildade e paciência e pela santa pobreza e obediência e castidade, que nós guardamos até o fim”.


[1] Cf.: Mateus 5,48

[2] Legenda dos Três Companheiros 51, 7-9

[3] Cf.: Carta a um Ministro 21-22

[4] Legenda Maior IV,11,1

[5] Legenda Maior IV,11,8-9

[6] Regra Bulada 1,1

[7] Cf.: João 14, 6

[8] Cf.: Mateus 5

[9] Testamento de São Francisco 40-41

[10] I Fioretti 20,

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