A figura de Maria das Dores, aquela que está aos pés da cruz, não pode ser esquecida, pois retrata para nós duas realidades: a primeira de dor e fracasso, a segunda de esperança e luta.
Frei Humberto Leite, OFM
A memória de hoje me faz lembrar de tantas mulheres de nosso tempo que sofrem diversas dores, causadas pela violência doméstica, pelo preconceito, por verem seus filhos em situações de vulnerabilidade social, por causa de uma sociedade de mentalidade machista, pela importunação e assédio sexual e tantas outras realidades de marginalização. Todas elas são espadas que transpassam as almas dessas mulheres.
As dores dessas mulheres, infelizmente, nos sinalizam que elas estão aos pés da cruz, sofrendo as injustiças de um sistema que é misógino e machista. Esta realidade deve nos incomodar, pois são os direitos das mulheres que estão sendo infringidos. Basta estarmos atentos quanto ao crescimento dos índices de violência doméstica, de feminicídio, de assédio sexual. Cada direito que é violado é uma espada que transpassa a alma de uma mulher.
A figura de Maria das Dores, aquela que está aos pés da cruz, não pode ser esquecida, pois retrata para nós duas realidades: a primeira de dor e fracasso, a segunda de esperança e luta.
Na primeira, a dor e o fracasso diante das realidades de violação dos direitos, é a realidade da morte: Maria, ao pé da cruz, vê seu filho Jesus crucificado. Foi uma morte cruel, truculenta e imperada por um sistema religioso e social que busca poder a todo custo. A morte a coloca em um estado de fracasso, pois ela não pode defender ou tirar seu filho daquela situação, dói ver o seu filho sendo assassinado de forma cruel. O fracasso aqui aponta para uma injustiça que ainda é existente. Em Maria das Dores, podemos ver o rosto de tantas mulheres que são mães e sofrem a perda de seus filhos em decorrência da violência e do abuso de poder daqueles que deveriam promover a segurança. São mulheres que se sentem fracassadas por não conseguirem defender seus filhos de um sistema que tira a vida de inocentes. Também vemos o rosto de mulheres que fracassaram em seus relacionamentos e acabaram perdendo a vida por causa de um falso amor e da violência doméstica. Maria das Dores nos mostra que nossa sociedade ainda está fracassando na defesa da vida.
A segunda realidade é da esperança e da força que brotam de uma realidade de dor e fracasso. A esperança e a força de Maria está na ressurreição de seu filho Jesus. Em meio a sua dor, ela buscou em seu coração, o ensinamento deixado por Jesus, para que tivesse força para assumir sua missão de discípula e mãe dos discípulos de Jesus. A esperança lhe deu força para prosseguir no projeto iniciado por Jesus: a construção do Reino de Deus. Hoje, vemos nas mulheres a força da esperança que brota de uma vida sofrida e dolorosa. Elas sabem que devem continuar a sua missão de construir uma sociedade mais justa. Em meio a dor, encontram a alegria de ser resistência e conquistar os seus direitos.
A esperança transforma a dor em luta. Maria das Dores é esse sinal de luta, força e resistência para as mulheres que buscam superar as fraquezas de nossa humanidade e, que constroem um estado de direito onde possam ser respeitadas e valorizadas.
Maria das Dores e Mulheres das Dores representam a força, a gana, a esperança de uma sociedade mais justa. Elas trazem em seus corpos a marca da vitória de quem supera a morte, a dor e a cruz, sendo resistência que defende a vida.