A mobilidade urbana é apontada como um desafio crucial, com o aumento de veículos e infraestruturas precárias gerando congestionamentos, poluição e impactos na saúde, exigindo soluções sustentáveis e comunitárias para construir cidades mais habitáveis.
Frei Vitor Vinicios da Silva[1]
Há uma urgência gigantesca em repensarmos o nosso tecido social, sinais são constantemente verificados em uma marcha desenfreada pelo ideal de progresso. Ao lado disso, nossas relações sociais, econômicas e afetivas são contratacadas pela “Mãe Terra” que dá diversos sinais como, por exemplo, as mudanças climáticas, inundações, terremotos e tantos outros. Desse modo, marchamos para um cenário emblemático e hostil à vida humana.
Essa mentalidade de um mundo sem limites levou a terra a exaustão, não comporta mais o modelo econômico que empregamos. Além disso, são múltiplos os desafios que necessitam não mais de uma boa vontade, mas de políticas estratégicas e uma interdisciplinaridade que leve em consideração todos os fatores que afetam a sociedade. Esses desafios são pungentes e vem sendo sinalizados por homens e mulheres comprometidos com as urgências do nosso tempo. Como exemplo, o líder da Igreja católica, Papa Francisco, nos afirmar que “[…] quando se colocam essas questões, alguns reagem acusando os outros de pretender parar, irracionalmente, o progresso e o desenvolvimento humano. Mas temos de nos convencer que, reduzir um determinado ritmo de produção e consumo, pode dar lugar à outra modalidade de progresso e desenvolvimento” (LS, n.191). Em consonância, somos, constantemente, convocados para a vivência de uma ecologia integral que deve ser vista não mais no seu sentido clássico, mas abrangente. É preciso compreender a ecologia integral nas suas dimensões sociais, econômicas, políticas e espirituais. Assim, buscaremos jogar luzes sobre uma dessas dimensões no intuito de ampliar o debate sobre esse tema tão urgente.
Uma das dimensões pouco falada, mas uma das mais sentidas é a ecologia cotidiana. Para entendermos um pouco melhor esse conceito, podemos sintetizar essa ecologia como uma dimensão da cidade, isto é, falamos de uma urbanização plana que escuta a população e cria espaços de convivência, oferta infraestrutura adequada, possibilita acesso a moradia, educação e tudo aquilo que é de direito fundamental do cidadão. Nesse sentido, refletiremos a mobilidade urbana como um dos temas urgentes em nossa pauta social.
A mobilidade urbana é a garantia de que todas as pessoas e bens possam se deslocar de maneira eficiente, é aquela que abarca os diversos modos de transporte como também a infraestrutura como, por exemplo, ruas e avenidas. Diante disso, sabemos que cada vez mais estamos verificando um colapso urbano pela quantidade de veículos e, ao mesmo tempo, constatamos infraestruturas precárias e transportes públicos sucateados. Entretanto, é preciso recorrer a vários fatores que contribuem, cada vez mais, para que esse colapso aconteça. Dessa forma, apontaremos alguns elementos que nos ajudam a compreender esse desafio social para chegarmos a essa constatação.
O primeiro fator é o aumento na fabricação de automóveis que vem numa crescente desenfreada. Segundo a Revista Fator Brasil, “[…] em janeiro de 2025, a produção de veículos no Brasil registrou 175.541 unidades, representando um aumento de 15,1% em relação ao mesmo período do ano anterior. Assim, este é o melhor desempenho para o mês desde 2021.” Ora, com base nesses índices, verificamos o aumento na produção de veículos que sobrecarregará ainda mais as vias e, paralelamente, teremos uma exaustão das nossas cidades em relação ao fluxo de veículos. Segundo Sabrina da Silva, no site NSC Total, “[…] o tempo médio anual perdido no trânsito por motoristas é em média 105 horas por ano em congestionamentos, tendo São Paulo na liderança do ranking nacional. Com isso, a equação apontada nos indica um aumento ainda maior em nossas capitais, reafirmando essa previsão de um congelamento das cidades e a geração de uma série de outros sintomas.
Hoje, milhões de brasileiros sofrem o estresse diário em suas locomoções pelas vias mega lotadas que tiram a paz de muitos motoristas. Por outro lado, um segundo fator que merece atenção é a redução na taxa de natalidade, pois, segundo o IBGE, em 2022 foi registrado 2,54 milhões de nascimento, no Brasil, sendo uma redução de 3,5% em relação a 2021, desde 1977. Contudo, esse decréscimo na taxa de natalidade conta com um aumento no consumo de forma exponencial e um fenômeno que modifica o cenário brasileiro, o êxodo rural. Segundo o Censo Demográfico de 2010, divulgado pelo IBGE, a taxa de migração campo-cidade era de 1,31% e dados mais recentes do IBGE mostram que, em 2023, essa taxa caiu para 0,65%, ou seja, apesar da redução na migração rural-urbana, apenas 14,8% da população brasileira residem em zonas rurais, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). Assim, constatamos que todos esses fatores contribuem para essa realidade ameaçadora.
Essa equação apresentada é um sinal de que centrar forças a temática da mobilidade urbana é extremamente necessária. É claro que não estamos, aqui, defendendo o não uso de veículos particulares uma vez que faz parte da cultura social e possibilita o deslocamento de muitos cidadãos. Entretanto, é preciso redobrar a atenção nessa malha social no sentido de possibilitar soluções eficazes para o problema. A questão não se reduz ao tempo gasto no deslocamento, mas atravessa uma gama de discussões como, por exemplo, transporte ecológico, sendo que os veículos automotores são uma das principais fontes de emissão de gases estufas, poluente do ar e sua fabricação é uma das que mais consomem recursos naturais. Além disso, esse congelamento cada vez mais real em nossas capitais gera uma série de doenças como distúrbios psicológicos, problemas respiratórios, dores musculoesqueléticas, distúrbios no sono, problemas digestivos, doenças cardiovasculares entre outras. Nesse sentido, esses dados apresentados evidenciam a necessidade urgente de soluções eficazes para melhorar a mobilidade urbana e reduzir os impactos dos congestionamentos nas capitais brasileiras. É fato que já estamos sentindo os sintomas de uma exaustão e viabilizar uma discussão sobre ecologia urbana (ou ecologia do cotidiano) é urgente, precisamos buscar soluções como investimento em políticas de infraestruturas, opções por formas de transporte mais sustentáveis como, por exemplo, transportes públicos, caronas solidárias e, sobretudo, discutir em nossas comunidades, escolas e empresas, temáticas como: planejamento urbano, ecologia urbana, sustentabilidade e todos os temas que permeiam essa urgência. Em suma, nosso intuito não é apresentar a solução, mas sinalizar questões urgentes em nosso Brasil no sentido de que não vamos encontrar soluções individualizadas e sim comunitariamente no intuito de construir cidades mais sustentáveis.
REFERÊNCIA
CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2025: Texto base. Brasília: Edições CNBB, 2024.
ESTADÃO. https://agro.estadao.com.br/summit-agro/exodo-rural-causas-e-consequencias
REVISTAFATORBRASIL. https://www.revistafatorbrasil.com.br/2025/02/12/producao-de-autoveiculos-registrou-crescimento-de-151-em-janeiro-diz-anfavea/
[1] Graduado em Filosofia pelo Instituto Santo Tomás de Aquino, graduado em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, Especialista em Ensino Religioso e Gestão Integradora pelo Instituto Pedagógico de Minas Gerais, IPEMIG.