“O tempo de hoje exige de nós a profecia do abraço ao leproso”: Frei Paulo Pereira abre o Congresso dos Irmãos Leigos

“O tempo de hoje exige de nós a profecia do abraço ao leproso”: Frei Paulo Pereira abre o Congresso dos Irmãos Leigos

“Chamem-se uns aos outros, todos sem exceção, irmãos menores… lavem os pés uns dos outros”

O Ministro Provincial da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, Frei Paulo Roberto Pereira, presidiu a Celebração Eucarística que abriu nesta segunda-feira, às 8h30, o Congresso dos Irmãos Leigos da Conferência Franciscana do Brasil e do Cone Sul, no Convento São Francisco, na região central de São Paulo. Este é o primeiro encontro dos irmãos leigos da Conferência e vai até sexta-feira que vem.

Frei Paulo disse que trazia a saudação dos ministros desta Conferência, que é presidida por Frei Daniel Alejandro Fleitas Zeni. “Nós entendemos que onde houver um evento da Conferência, o Ministro daquela localidade faz as vezes da animação da Conferência. Então, em nome de toda a Conferência já acolho a todos aqui nesta casa, o Convento São Francisco, durante muitos anos foi a Sede Provincial e continua a ser o espaço de acolhimento de muitas reuniões”, saudou Frei Paulo, brincando que logo os frades se acostumariam com as escadas que levariam ao “comedouro e à capela”.

Ele fundamentou sua reflexão, deixando muitas provocações, a partir do objetivo do encontro que está expresso no tema que foi escolhido: “Renovar e repensar a nossa vocação de irmãos leigos, inseridos na realidade da nossa Conferência e abraçar o nosso futuro sonhando construir laços de fraternidade em saída com os menores de hoje”.  E no lema: “Chamem-se uns aos outros, todos sem exceção, irmãos menores… lavem os pés uns dos outros” (RnB VI, 3-4).

Segundo ele, renovar e repensar são verbos fortes, mais forte ainda é a vocação de irmãos leigos. “E aí inseridos na realidade da Conferência, vem uma proposição que nos lança, que nos projeta ao futuro: abraçar nosso futuro, sonhando construir laços de fraternidade. E fraternidade já tem uma característica que se complementa neste tema, uma fraternidade em saída com os menores de hoje. Então, nessa proposição extensa nós temos aqui matéria suficiente um ano inteiro de reflexão”, avaliou.

Segundo o Ministro, o lema propriamente é o que nós bebemos na Ordem, no processo de clarificação da identidade franciscana, “chamem-se uns aos outros, todos sem exceção, irmãos menores”: “E aí para evidenciar a minoridade recorremos ao lava-pés, sinal evidente da minoridade”.

Frei Paulo lembrou a importância da nova Conferência do Brasil e Cone Sul. “Nossa Conferência nasce nova com a disposição de tirar de nossa vista aquilo que nos impede de enxergar. Então, é preciso enxergar, enxergar de novo, ver novos horizontes. A nova visão é proporcionada pelo despertar e pela iluminação de Jesus Cristo. É assim que nascemos”, disse.

Segundo ele, é a oportunidade de abraçar nosso futuro e construir novos laços, deixarmo-nos mover pela novidade do Evangelho. “E nós viemos aqui para São Paulo, uma cidade rica, que concentra a maior riqueza do país. Ao mesmo tempo é uma cidade que exclui, uma cidade que gera pobreza, gera marginalidade. É a cidade da contradição. E nós vivemos também essa contradição. Posso dizer com muita fraternidade, vocês que andaram por aqui ou andarão nesses dias, vão ver dentro da cidade de São Paulo que ela foi ocupada e que dá visibilidade à decadência da nossa sociedade”, disse.

Para Frei Paulo, ao lado do Convento estão os vizinhos que se formam na mais antiga escola de Advocacia do Brasil: a elite paulistana estuda aqui. E ao lado, as pessoas em situação de rua. “E assim, para entrar na rua Riachuelo, a gente tem que atropelar pessoas que estão dormindo nas ruas. É uma contradição. Os próprios frades desta casa vivem uma contradição, dizendo: ‘esses homens e mulheres em situação de rua, alguns deles se tornam violentos e essa violência espanta os nosos piedosos devotos que vêm à nossa igreja. E a gente precisa dar um jeito nisso’. Essa reflexão acontece aqui nesta casa, entre nós, os Frades Menores, que queremos abraçar os menores. É uma contradição. Então, não é só a cidade que gera contradição. Essa contradição a gente a traz no nosso próprio peito. Esse é um desafio grande para todos. E aí a gente tem que lembrar que os pobres nos evangelizam. Não é só São Vicente de Paulo que dizia que os pobres são nossos mestres. São Francisco de Assis se envergonhava de ver alguém mais pobre do que ele e dava aquilo que ele tinha para reverter essa situação”, lembrou.

“Então, essa contradição que a gente vive deve sempre nos alertar: os pobres são os nosos mestres. Os pobres nos devem aceitar como companheiros de caminhada. Os pobres que têm carne e osso, que têm cheiro. Os pobres têm cheiro de feridas, de cachaça, cheiro de quem não tem acesso aos banhos. Isso nos provoca, mas são homens de carne e osso e é transformador o encontro de São Francisco com o leproso, que a gente canta, que a gente conta aos que queremos convidar a ser um dos nossos. Mas poucas vezes nós temos disposição, coragem ou iniciativa de ir até eles. São as contradições que nos afastam de nosso ideal e nos impedem de sermos Irmãos Menores com os menores. Então é preciso que a gente busque resgatar a nossa identidade mais ainda, abraçar a profecia. O tempo de hoje exige de nós a profecia desse abraço, a profecia do abraço ao leproso”, animou.

Segundo ele, por isso que nós devemos aproveitar esse Congresso na perspectiva do grande encontro que haverá em Assis em 2025, “que vai falar da busca da nossa identidade carismática, da nossa identidade primeira, daquilo que nos encantou, da identidade franciscana. O Espírito que fez nascer a Ordem Franciscana, que moveu o movimento e por isso então nós vivemos a graça dos Jubileus”.

NO SALÃO SÃO DÂMASO

O primeiro encontro dos 30 frades que participaram deste Congresso se deu no Salão São Dâmaso às 10 horas, quando Frei Fernando Ferrario, Secretário para a Formação e os Estudos da Conferência, fez a apresentação do encontro e da programação até sexta-feira. Em seguida, foi apresentado um relatório com base nos questionários que foram enviados aos irmãos leigos.

PRIMEIRO ENCONTRO COM FREI VANILDO

O tema “Escuta da realidade, da Igreja e da vida religiosa na América Latina”, foi abordado à tarde pelo assessor Frei Vanildo Luiz Zugno, frade capuchinho que possui graduação em Filosofia pela Universidade Católica de Pelotas, graduação em Teologia pela Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF – e mestrado em Teologia pela Université Catholique de Lyon.

Frei Vanildo agradeceu o convite para estar com os irmãos leigos neste Congresso. “Vim com a perspectiva de aprendermos juntos e nos ensinarmos mutuamente”.

Segundo ele, talvez a crise que o mundo e a Igreja estão vivendo hoje seja semelhante ou próximo à do fim do século 15 e início do século 16. “O início de uma nova era. Mudança de paradigmas. Por isso que as coisas se sacodem tanto. Às vezes quando olhamos a realidade, parece aqueles vidros embaçados ou vidro quebrado. Existe uma imagem, mas não se consegue defini-la, não se consegue ver o que está dentro. Trata-se de uma imagem tremida. Tem muita gente perdida. Nesse momento de mudança surgem o medo e a insegurança. O medo e a insegurança levam aos fundamentalismos”, disse, explicando que é importante fazer análise de conjuntura para entender a realidade que vivemos.

“Nós temos que retomar essa prática porque ela serve para nos ajudar a enxergar caminhos. Quais as saídas para não voltar para trás ou para não cair no precipício”, emendou.

“Claro, nós estamos num encontro que não tem como objetivo tomar decisões. Estamos aqui para conversar, para partilhar, para nos ajudar. Mas na nossa vida nós temos que tomar decisões”, lembrou, explicando os termos conjuntura e estrutura.

Segundo ele, não existe análise de conjuntura neutra ou desinteressada. Toda análise é parcial. Ela sempre terá lado, ou seja, a leitura da realidade sempre é feita sob determinado enfoque ou ponto de vista.

“Tem uma coisa que nós podemos fazer, que é sempre nos perguntar: ‘Onde estão os nossos pés’ e compartilhar com os outros essa experiência de onde pisam nossos pés. E Frei Vanildo convidou os frades a compartilhar suas experiências pela diversidade de lugares que os frades são oriundos.

No final, deixou o seguinte questionamento: É preciso refazer o modo como nós nos pensamos no mundo.

SEFRAS

À noite, Frei Marx Rodrigues da Silva e Frei Tiago Gomes Elias explicaram para os frades o que é Serviço Franciscano de Solidariedade (SEFRAS), que atende mais de 4 mil pessoas todos os dias em diversos serviços. Entre seus públicos atendidos, crianças e adolescentes, pessoas idosas, imigrantes e refugiados, pessoas acometidas pela hanseníase e população em situação de rua.

À tarde desta terça-feira os frades terão oportunidade de conhecer alguns dos serviços na capital paulistana. Às 10 horas, Frei Vanildo continua a reflexão. Desta vez, ele fala sobre os irmãos inseridos na realidade, sinodalidade e minoridade.

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