São João Evangelista

São João Evangelista

Somos convocados a ser como o discípulo amado, que nos ensina, com sua coragem e perseverança, a não sermos passivos diante dos desafios do mundo.

Helia Carla de Paula Santos[1]

O Evangelho de João, apóstolo de Jesus Cristo, tem como símbolo a águia, segundo a tradição cristã, e isso carrega um profundo significado pois essa ave voa nas alturas – portanto próxima de Deus, fazendo seus ninhos nas montanhas e penhascos, a fim de proteger melhor seus filhotes. 

Nos primeiros séculos da Igreja, a comunidade cristã teve acesso a textos (Evangelhos e Epistolas) que tinham um objetivo catequético e pedagógico, pois se preocupavam com o ensinamento sobre Jesus Cristo. Dentro dos grupos eclesiais, João salientou a presença de algumas pessoas chamadas de “anticristos” (1Jo 2,18) e “sedutores” (2Jo 1,7) que espalhavam inverdades sobre o Senhor. Essas seitas se autodenominavam cristãs, teciam ensinamentos diversos que se alastraram por várias regiões, mas eram falsas, lançando sombras sobre a verdade e sobre aquilo que era, de fato, autêntico e correto. Esse é o motivo por que os textos que compõem o Novo Testamento procuram, sobretudo, combater as falácias que surgiram nessas seitas.

Entre os textos escritos, que serviam como suporte teológico, encontramos aqueles atribuídos a João, um dos dozes apóstolos escolhidos por Jesus, e que era irmão de Tiago. João, também conhecido pela tradição como “o discípulo amado”, foi martirizado a mando do rei Herodes (At 12, 2). Esse apóstolo nos apresenta um horizonte que desembarca na realidade dos primeiros seguidores de Cristo, e sua tarefa era dizer, nas entrelinhas de seus textos, que vale a pena continuar com Jesus, ainda que a conjuntura seja a repressão imposta pelos romanos e pelo judaísmo vigente, e mesmo que a tirania impeça o “direito de comprar e vender” para sobreviver (Ap 13,17).

João mostra as vicissitudes e desafios que as comunidades precisavam enfrentar. No Evangelho, encontramos os discursos dos fariseus, que eram autoridades muito próximas ao povo, e que, a partir do ano 70, tornaram-se inimigos do cristianismo (Jo 9). Os discursos presentes no texto instruem a Igreja sobre como enfrentar os fariseus. Além disso, o autor, também a partir dos discursos, evidencia a incredulidade, a dúvida e a desconfiança dessas autoridades, as quais não criam no Filho do Homem (Jo 9, 35). Esse é o maior perigo que as pessoas naquele tempo (e hoje) enfrentavam (e enfrentam): não exatamente ser expulsas, ou se tornarem extrassinagogais, e sim não reconhecerem Jesus como Senhor! Isso, sim, é um risco, um apuro, porque não há esperança fora de Cristo!

Na tradição apostólica, em seus escritos, João nos interpela na nossa maneira de ser seguidores de Cristo. Sua abordagem literária vai além do primeiro século, uma vez que capta as situações que vivenciamos no século XXI. Nas comunidades primevas como nas comunidades atuais, os desafios são distintos e múltiplos, porém sua fidelidade ultrapassa o tempo e nos ensina a atualizar, renovar e aperfeiçoar a nossa prática, nosso estilo e nossos hábitos que se contrapõem ao compromisso de ser discípulo de Cristo.

Somos convocados a ser como o discípulo amado, que nos ensina, com sua coragem e perseverança, a não sermos passivos diante dos desafios do mundo. Em suas cartas, o autor nos fala que devemos caminhar sempre na luz (1Jo 1), que devemos romper com as estruturas do pecado (1Jo 2) e viver como filhos de Deus (1Jo 3). São João nos fala da caridade e da verdade (2 Jo, 3 Jo) como princípios e fundamentos na relação com Deus, com o meio ambiente, com nós mesmos e com os outros.

Faz-se necessário, pois, retornar à tradição e evocar a herança que João Evangelista nos brinda, a fim de termos maior intimidade com Deus e viver a certeza de seu amor por nós.


[1] Mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta

Leia outras notícias