Sexto dia do Capítulo da Província Santa Cruz

Sexto dia do Capítulo da Província Santa Cruz

O sexto dia do Capítulo Provincial (19/10/2024), iniciou com a celebração eucarística, presidida por Frei Adilson Corrêa da Silva, concelebrada por Frei Agmar Roberto Ferreira, tendo como diácono, Frei Hericles Lima Gomes.

O sexto dia do Capítulo Provincial (19/10/2024), iniciou com a celebração eucarística, presidida por Frei Adilson Corrêa da Silva, concelebrada por Frei Agmar Roberto Ferreira, tendo como diácono, Frei Hericles Lima Gomes.

Após o café da manhã os frades encaminharam para a sala capitular e o moderador do dia, Frei Adilson Corrêa da Silva acolheu os frades do tempo de profissão temporária que chegaram no dia anterior e salientou a ordem dos trabalhos do dia.

Em seguida foi lido o texto elaborado pela equipe de síntese a respeito dos relatórios dos Secretariados de Formação e Estudos, Missão e Evangelização e Administração.

A parte da manhã encerrou com o almoço.

Os trabalhos da tarde iniciaram com a Hora Média, que foi presidida por Frei Robério Antunes Ruas. Logo após, a assembleia capitular iniciou as dinâmicas de grupos, para a discussão do plano trienal da Formação Permanente.

Às 19h30 iniciou o Lucernário, que foi presidido pelo Frei Ronilson Caetano da Silva.

Lucernário – Ofício Litúrgico da Noite

Nos primeiros tempos da Igreja, os cristãos santificavam o fim do dia com uma prece comunitária. Nos mosteiros, cantavam-se as “Vésperas” ou “Completas”. Nos meios paroquiais, porém, era costume fazer o “Ofício do Lucernário” e as antigas “Vigílias”, muito freqüentes, ainda, nas Igrejas Orientais.

O nome “Lucernário” faz alusão evidente às luzes que se acendiam ao findar o dia. Este rito tem a luz como centro. Os fiéis se reuniam nas igrejas para juntos fazerem a oração da noite do povo de Deus, agradecer os benefícios recebidos durante o dia e suplicar a proteção de Deus durante a noite que se iniciava.

O simbolismo da luz representa um papel importante no conteúdo das horas de Laudes e Véspera: a luz do novo dia é cantada como símbolo de Cristo ressuscitado; e as luzes que se acendem ao cair da noite recordam a luz plena e sem ocaso que é o próprio Cristo.

De fato, o início da Vigília Pascal é um vestígio do antigo Lucernário. Não se pode esquecer do papel que representa, na piedade popular, o fato de acender velas: constitui um símbolo da vida cristã que deve consumir-se dando luz e calor; e deve estar sempre pronto, como as Virgens Prudentes, com suas lâmpadas acesas.

Os Frades retornaram ao salão capitular para as comunicações. Frei Paulo Afonso apresentou a música “Não dá mais para esperar”, Frei Ademilson Salvino dos Santos leu um texto de sua autoria: “O amigo Imaginário” e Frei Basílio de Resende encerrou falando da importância da espiritualidade como um alimento que não deve ser substituído, é indispensável cultivar “o espírito de oração e devoção”; sem isso nós nos tornamos ativistas, assistencialistas, funcionários de uma ONG.

O Silêncio Entre Nós: Uma Reflexão Sobre Meu “Amigo Imaginário” (Frei Ademilson Salvino dos Santos)

Eu tenho um amigo imaginário que me acompanha desde a infância. Nunca tive muita percepção sobre sua aparência, mas sempre notei que as pessoas nos tratavam de maneiras bem diferentes — ele em seu mundo e eu no meu. Nunca invadimos o espaço um do outro; na verdade, eu nunca fui convidado para isso (algo realmente curioso, como se ele não fosse, de fato, meu amigo). Apenas conheço seu contorno, mas nem sei quem são seus pais, se estão vivos ou se já faleceram. Como ele é muito novo, suponho que estejam vivos. Chamo-o de amigo, pois nunca revelou seu nome; sempre nos referimos assim, como amigos. Era “amigo” para cá, “amigo” para lá, e assim se passaram 26 anos de amizade.

Ele sempre esteve comigo quando eu estava sozinho, mas sempre que alguém da minha família ou qualquer outra pessoa chegava, ele se despedia e desaparecia — de verdade, desaparecia mesmo. Eu sempre quis apresentá-lo aos meus amigos e familiares, mas ele nunca quis ou nunca tinha tempo. Não sei o que acontece; ele sempre some. Mas assim que as pessoas vão embora, ele volta. Pensando bem, ele é realmente um amigo fiel! Por isso eu nunca me senti sozinho, pois ele sempre foi muito atencioso comigo. Em 26 anos de amizade, ele nunca me decepcionou — algo raro nos dias de hoje.

Ele sempre dizia que racismo não existia. E olha que eu já contei várias histórias de olhares desconfiados e situações injustas, mas ele duvidava. Isso me fazia questionar se não estava exagerando, se minha percepção era mesmo correta. Às vezes, me sentia até culpado, como se estivesse julgando as pessoas de maneira errada. Ele é meu amigo, e um bom amigo, daqueles que trazem lembranças boas e me fazem perder a noção do tempo.

Recentemente, percebi algo que nunca tinha analisado: ele é branco. Não apenas branco, mas daquele tipo “padrão” que a sociedade idealiza. Isso me ajudou a entender muita coisa, como o fato de ele nunca ter me apresentado aos amigos ou à família dele, de não ter me mostrado o mundo em que vive. Não que ele seja racista, longe disso. Talvez ele quisesse me proteger de algo que sabia que existia no seu meio. Algo que, para ele, sempre pareceu distante. Afinal, amigos podem enxergar as coisas de formas diferentes, mesmo quando a amizade é verdadeira.

Por muito tempo, aceitei essa explicação. Mas, com o passar dos anos, uma verdade mais profunda começou a se revelar. Meu amigo nunca via o que eu vivia porque não podia. Ele caminhava ao meu lado, mas seus pés nunca tocaram o chão que me sustentava. Ele vinha de um mundo leve, enquanto o meu era denso, marcado por raízes profundas que ele não podia compreender.

Então, percebi: eu, uma pessoa preta, criei um amigo imaginário branco sem me dar conta. Talvez eu o tenha criado assim para protegê-lo das adversidades que eu enfrentava. No fundo, não queria que ele passasse pelos mesmos fardos que eu carregava. Ele representava um refúgio onde eu pudesse respirar, um espaço onde as dores dos meus ancestrais não pesavam tanto. Era uma maneira de me proteger, de criar uma realidade onde o preconceito não me alcançasse.

Ao mesmo tempo, ao criar esse amigo branco, eu buscava me encaixar em uma realidade que, na verdade, nunca foi a minha. Ele era o espelho de uma existência que eu jamais teria — leve, protegida e acolhida pelas estruturas que sempre me excluíram. Por meio dele, eu tocava, ainda que brevemente, o sonho de pertencer a esse outro mundo. Mas, ao despertar dessa longa fantasia, entendi que ele não podia me oferecer o que eu procurava. Ele era apenas uma sombra de algo que nunca seria meu.

Foi então que compreendi a sabedoria dos meus ancestrais. A força que me acompanha não está em mundos imaginários, mas na história que carrego em meu sangue. Meus antecessores também criaram seus próprios refúgios, mas sabiam que a verdadeira liberdade não vem da fuga, mas do confronto com a realidade. Essa dualidade se revelou para mim: meu amigo imaginário, com toda a sua proteção, era também um limite, um eco de um desejo de pertencimento que não podia se realizar em seu abraço branco.

Assim, após 26 anos, acordei para a verdade. Meu amigo branco foi uma criação de proteção e busca de acolhimento em um mundo que me negava. Mas hoje, com a sabedoria dos que vieram antes de mim, entendo que a acolhida que eu buscava não estava fora de mim, mas nas minhas raízes, na minha ancestralidade. Ele foi uma fuga necessária em tempos de dor, mas minha força sempre esteve na terra que piso, na pele que visto, nas histórias que me precedem.

Agora, vejo que não é o abandono do amigo que me liberta, mas o reconhecimento de que ele sempre foi um reflexo de uma necessidade que, na verdade, já estava sendo respondida dentro de mim desde o início. No fim, meu amigo imaginário foi tanto proteção quanto desafio. E nessa dualidade, encontro não só o fim de uma amizade, mas o começo de uma compreensão mais profunda de quem eu sou.

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