Evangelizar é, portanto, transformar a realidade por dentro, obedecendo ao mandato do Senhor de “ide, e fazei discípulos…”
Seguindo as Orientações para Elaboração de Projeto de Vida e Missão proposto pela Província Santa Cruz, o nosso 4º dia de retiro, 27/7, ficou sob a responsabilidade de nosso confrade, Frei Alexsandro Rufino, que nos conduziu na reflexão sobre a nossa Dimensão Missionária e Evangelizadora, nossas Perspectivas, sonhos e utopias…
O Projeto de Vida é comum, inerente a todo ser vivente. Em particular o nosso Projeto de Vida e Missão nos veicula ao evangelho/projeto de Jesus Cristo. E neste contexto se faz necessário entender os três pressupostos para compreendermos a linha histórica do tempo.
Em primeiro lugar a história desenvolve de forma espiral e não linear, plana. O pensamento se torna complexo, articulado de modo diferente, o que alarga nossa maneira de abstrair a história. Num segundo momento se faz necessário “refrescar a cuca”, tirar o grande chapéu do conhecimento, que nos leva a ter sempre uma palavra para tudo, nem sempre com conhecimento do todo, uma palavra de escritório, de gabinete. Em terceiro lugar precisamos nos debruçar na figura do frade, que muitas vezes se apresenta de forma atrofiada, ou seja, cabeçudo, mãos pequenas e pés enraizados. Um “homem sábio” ou “homem que sabe” e é utilizado para designar cientificamente o homem moderno e também o frade. “Cabeçudo”, ou seja, repleto de conceito e ideias, mas que não ganham materialização na vida, pois é incapaz de práticas vivenciais e sobretudo de caminhar, sair. Por fim, mas não menos importante, a cadeira de Moisés, o lugar de quem sabe e se agarra a este saber, o que dificulta o levantar da cadeira e dar passos em direção à planície onde se encontra a vida pulsante do povo.
Estamos no nível da pessoa. Uma pessoa que se compromete, a partir de sua experiência, de sua intimidade; é a resposta da pessoa ao apelo do evangelho. Esta resposta é como água que brota da fonte, mas a sua direção e intensidade é parte do mistério.
O processo mais complexo é o da encarnação do Reino de Deus, pelo anúncio da salvação diante de tudo que oprime. Qual é a boa notícia que eu trago para o mundo? Evangelizar é explicitar esta boa notícia em todos os extratos da humanidade. O Espírito já está, antes, apesar, de nós.
A finalidade da evangelização, portanto, é precisamente esta mudança interior; e se fosse necessário traduzir isso em breves termos, o mais exato seria dizer que a Igreja evangeliza quando, unicamente firmada na potência divina da mensagem que proclama, ela procura converter ao mesmo tempo a consciência pessoal e coletiva dos homens, a atividade em que eles se aplicam, e a vida e o meio concreto que lhes são próprios””. [EVANGELII NUNTIANDI, 18].
Evangelizar é, portanto, transformar a realidade por dentro, obedecendo ao mandato do Senhor de “ide, e fazei discípulos…”
Francisco de Assis envia os frades aos quatro cantos do mundo para anunciar a paz. Esta paz só pode ser anunciada de forma livre de toda ganância, por isso o homem do Evangelho não poderia ser considerado um inimigo que vai roubar a sua riqueza e seu poder. Testemunhar para a paz. Se adestrar para a Paz diante de um mundo tão polarizado e adoecido. Somente um discípulo livre, pode anunciar a paz!
Assim, percebemos que a missão não é um anexo do nosso carisma, mas este se vincula ao mandato missionário de Cristo a seus seguidores. O Anúncio e o Testemunho devem primeiro se nutrir na vida do indivíduo em fidelidade à sua vocação de menor. É necessário conhecer e experimentar a espiritualidade, beber das fontes, evangelho e regra, para depois se dispor ao “Ide”.
Seguimos a Cristo na forma do carisma franciscano, a quem espera-se que adote um estilo de vida de acordo com os mais pobres e simples. Diante de tal premissa, o nosso modo de viver, atrai ou repele? – Aqui destacamos a questão da coerência, que deve antes de tudo transbordar a profecia, através de uma continua conversão – o que devo abandonar?
As palavras nem sempre vem carregadas desta novidade do evangelho. Por isso, é de primeira necessidade pregar a si, para depois poder colaborar, isso mesmo, somos colaboradores, o protagonista é sempre o destinatário deste anúncio, ou seja, o povo de Deus.
Testemunho e Palavras. Onde está e o que se faz?!
Nós participamos, tomamos parte, colaboramos, estamos juntos numa barca maior, através de uma comunhão fraterna, evitando-se os particularismos na evangelização.
A simplicidade da presença deve ser a grande forma, sem estardalhaços, pois já dizia os antigos, “a palavra pode convencer, mas os exemplos arrastam”. “Preguem, se necessário usem palavras”, nos admoesta São Francisco. Então, como evangelizar?
A fraternidade deve ser por excelência o ícone do Reino de Deus e sua presença. O modo de evangelizar vai desde o testemunho de vida ou uma proclamação silenciosa, ou, testemunho de vida ou uma proclamação explicita da palavra. Mas sempre parte do testemunho de vida!
Aqui incorre-se em alguns riscos: Ou não tem apreço à palavra do amado; ou não tem apreço à fé católica; ou utiliza-se de um discurso de autoajuda, muito usual em tempos atuais. Estes riscos apontam para a falta de credibilidade do anúncio, pois este não penetra na realidade; e para a falta de capacidade de não perceber a presença de Deus na realidade, com pessimismo, causando fechamento e estagnação, neste caso se faz necessário a inalação do sopro do Espírito, um reordenamento, evitando assim que caia nas mais diversas formas de abusos. A adesão do evangelho não se faz pela força do constrangimento, mas pela sedução.
Como uma possível saída a estes impasses, uma vida fraterna mais autêntica, entendendo que, o nosso carisma integra a uma instituição maior, que precisa ser articulado, em comunhão com a sua realidade. Outra forma de superar o impasse, é crescer na responsabilidade e coerência do anúncio explícito do evangelho, ou seja, transbordar, Ir.
Esse transbordamento se torna efetivo na partilha com aqueles que caminham conosco, os leigos e leigas, levando-os também a abraçar a nossa vocação primeira, de “restaurar a minha casa que está em ruínas”. Neste sentido precisamos agir voluntariamente como Francisco de Assis, e Ir ao encontro dos chagados do nosso tempo.
Observem o evangelho da liturgia de hoje, Mt 13,10-17, que muito veio colaborar com as dimensões que hoje refletimos, e nos perguntemos:
Que mensagem contraditória apresentamos?
Será que olhamos e não vemos?
Ouvimos e não escutamos?
Será que nosso coração se tornou insensível?
Por fim, cabe uma última distinção… entre Evangelização e Pastoral. A evangelização é parte constitutiva do DNA, do carisma franciscano, já a pastoral, são as ações que transbordam esse carisma.