16 de março: Dia Nacional de Conscientização sobre as Mudanças Climáticas

16 de março: Dia Nacional de Conscientização sobre as Mudanças Climáticas

O modo como o ser humano tem habitado o planeta Terra, com toda a dinâmica de expropriação, consumo e descarte põe em risco populações inteiras, forçadas a migrarem de seus países ou mesmo correm o risco de desaparecerem.

Frei Oton da Silva Araújo Júnior, ofm

O tema das emergências climáticas não é unânime em reconhecer os efeitos da presença do ser humano no planeta Terra. Há quem defenda que os processos que temos vivido com relação ao aumento de temperaturas, chuvas intensas e, ao mesmo tempo, secas severas e tantos outros fenômenos façam parte de um processo natural do planeta, que ora aquece e resfria por si mesmo, sem que a ação do ser humano tivesse uma incidência significativa sobre esses fenômenos, ou que se desse numa proporção tão irrisória que seria incapaz de causar tais mudanças.

De outro modo, a grande maioria da comunidade científica tem sustentado que a atividade humana tem, sim, interferido no ritmo do planeta, como nunca antes na história. Um marco que costuma ser usado para identificar o aumento exponencial da atividade humana sobre o ritmo do clima é a Revolução Industrial, quando houve uma aceleração na exploração do solo, na passagem do modo de vida rural e artesanal para adoção de um ritmo cada vez mais urbano e de uma produção em larga escala. Aquilo que antes era denominado ‘aquecimento global’ passa, aos poucos, a ser entendido como mudança climática, com índices muito mais preocupantes.

Um termo frequentemente utilizado para caracterizar este período é o chamado “Antropoceno”, que sucederia a Era do Holoceno, no qual o ser humano passa a ser identificado como o grande responsável pelas alterações na vida do planeta. Na segunda metade do século XX é possível perceber uma grande aceleração nos ritmos de produção, consumo e descarte, afetando diretamente na dinâmica planetária, num aumento de grande emissão de carbono e nitrogênio.

De todo o dióxido de carbono atribuível aos humanos estocados na atmosfera, ¾ foram emitidos nos últimos 70 anos, e os números nos ajudam a entender por quê: nas últimas três décadas, os veículos automotores saltaram de 40 milhões para 850 milhões; Plástico = de um milhão de tonelada para 350 milhões; Fertilização agrícola = de 4 milhões de toneladas para 85 milhões.

Mas nem todos concordam com o termo Antropoceno. É como se a espécie humana, como um todo, fosse a responsável pelas alterações na vida do planeta. E bem sabemos que os países com maiores produções industriais é que são os grandes vilões do clima, enquanto países empobrecidos sofrem as consequências de algo do qual contribuíram quase nada! Dessa forma, há quem prefira expressões como “Ocidentaloceno”, “Capitaloceno”, para precisar quem de fato tem sido o responsável por tais ingerências. Quanto ao período em que se inicia a Era do Antropoceno também não há unanimidade, mas muitos indicam o período pós-guerra, a partir da década de 50 com o aumento industrial e as consequentes emissões de gazes de efeito estufa.

Quais são os efeitos da mudança do clima na vida das populações? Segundo a Agência da ONU para refugiados (ACNUR), “as mudanças climáticas revelam uma clara injustiça, já que aqueles que menos contribuíram para a degradação ambiental são os que vêm sofrendo mais. Em uma tendência preocupante, quase 60% das pessoas forçadas a se deslocar no mundo encontram-se nos países mais vulneráveis ao impacto das mudanças climáticas, como Síria, República Democrática do Congo, Somália, Afeganistão e Mianmar”. Somente em 2020 foi aceita a nomenclatura de ‘refugiados climáticos’: populações que em decorrência das alterações do clima, se veem obrigadas a deixar sua terra. Este número aumenta a cada ano.

As mudanças climáticas e o Papa Francisco

Francisco dedica o primeiro capítulo da Laudato Si sobre “O que está acontecendo com a nossa Casa”. O capítulo se divide nos seguintes temas: 1. Poluição e mudanças climáticas; 2. A questão da água; 3. Perda de biodiversidade; 4. Deterioração da qualidade de vida humana e degradação social; 5. Desigualdade planetária; 6. A fraqueza das reações; 7. Diversidade de opiniões.

Francisco propõe pensar o clima como um bem comum, e alerta: “Se a tendência atual se mantiver, este século poderá ser testemunha de mudanças climáticas inauditas e duma destruição sem precedentes dos ecossistemas, com graves consequências para todos nós. Por exemplo, a subida do nível do mar pode criar situações de extrema gravidade, se se considera que um quarto da população mundial vive à beira-mar ou muito perto dele, e a maior parte das megacidades estão situadas em áreas costeiras” (LS 24).

E o Papa comunga com a ONU ao se preocupar com os países mais pobres: “Muitos pobres vivem em lugares particularmente afetados por fenômenos relacionados com o aquecimento, e os seus meios de subsistência dependem fortemente das reservas naturais e dos chamados serviços do ecossistema como a agricultura, a pesca e os recursos florestais. Não possuem outras disponibilidades econômicas nem outros recursos que lhes permitam adaptar-se aos impactos climáticos ou enfrentar situações catastróficas, e gozam de reduzido acesso a serviços sociais e de proteção” (LS 25).

“Os efeitos das mudanças climáticas se farão sentir durante muito tempo, mesmo que agora sejam tomadas medidas rigorosas, alguns países com escassos recursos precisarão de ajuda para se adaptar a efeitos que já estão a produzir-se e afetam as suas economias” (LS 170).

Em 2023, por ocasião da Conferência do Clima, em Dubai (COP 28), Papa Francisco retomou o tema das mudanças climáticas com uma Exortação Apostólica LAUDATE DEUM. Em comparação com a Laudato Si, Laudate Deum é um escrito bem menor, tem apenas 73 parágrafos. Nela, Francisco se mostra preocupado, porque quase uma década depois da publicação da Laudato Si, a situação não só não melhorou, mas se agravou em várias regiões do planeta.  “Com o passar do tempo, dou-me conta de que não estamos reagindo de modo satisfatório, pois este mundo que nos acolhe, está se desmoronando e talvez aproximando dum ponto de ruptura” (n.2).

Papa Francisco aponta os efeitos das mudanças climáticas na vida de grande parte da população mundial, demonstrando que os efeitos práticos das alterações no clima têm impacto direto na vida de inumeráveis famílias mundo afora: “A subida do nível do mar e o degelo dos glaciares podem ser facilmente notados por uma pessoa no arco da sua vida e provavelmente, dentro de poucos anos, muitas populações terão de deslocar as suas casas por causa destes fenômenos” (n.6).

Francisco faz eco à constatação de que a ação humana é a principal causadora dos problemas climáticos na atualidade: “A concentração na atmosfera dos gases com efeito estufa, que causam o aquecimento global, manteve-se estável até ao século XIX: abaixo das 300 partes por milhão em volume. Mas a meados daquele século, em coincidência com o progresso industrial, as emissões começaram a aumentar” (n. 11).

Não é o objetivo aqui percorrer toda a Laudate Deum. Em suas conclusões, Francisco exorta: “Duma vez por todas acabemos com a atitude irresponsável que apresenta a questão apenas como ambiental, ‘verde’, romântica, muitas vezes ridicularizada por interesses econômicos. Admitamos, finalmente, que se trata dum problema humano e social em sentido amplo e a diversos níveis. Por isso requer-se o envolvimento de todos” (n.58).

E faz o convite “a cada um a acompanhar este percurso de reconciliação com o mundo que nos alberga e a enriquecê-lo com o próprio contributo, pois o nosso empenho tem a ver com a dignidade pessoal e com os grandes valores. Entretanto não posso negar que é necessário sermos sinceros e reconhecer que as soluções mais eficazes não virão só dos esforços individuais, mas sobretudo das grandes decisões da política nacional e internacional” (n.69).

O site do Governo Federal apresenta algumas ações que podem minimizar os efeitos das mudanças climáticas:

  • Utilizar os recursos naturais com responsabilidade;
  • Apoiar iniciativas de carbono neutro;
  • Priorizar atividades que reduzam a emissão de gases de efeito estufa;
  • Reduzir o consumo de combustíveis fósseis;
  • Reduzir a quantidade de resíduos sólidos;
  • Investir em embalagens mais sustentáveis.

Esses são alguns hábitos – diz o site do Governo – que podem nos ajudar a reduzir e reverter os efeitos das mudanças climáticas, como o consumo consciente e a preferência por produtos e serviços mais sustentáveis. Cabe a cada um de nós refletir sobre o impacto dos poluentes e outras ações prejudiciais ao clima.

Como dissemos recentemente (cf. https://ofm.org.br/4-a-conversao-ecologica/ ), as decisões na relação socioambiental têm de passar pelos níveis micro e macro, atingindo as pessoas em suas ações cotidianas, em casa, nos lugares que frequentam, mas certamente que as grandes decisões de governo, os modos de produção e exploração da terra, as emissões de gazes de efeito estufa são decisivas para o controle ou a ruína das questões climáticas, atingindo diretamente a população como um todo, não só os vulneráveis.

Ignorar as mudanças no clima, fingir não as ver, não tomar as medidas cabíveis é um suicídio planetário, e um pecado contra Deus e o próximo.

Referências:

FRANCISCO, Encíclica Laudato Si, 2015.
FRANCISCO, Exortação Apostólica Laudate Deum, 2023.
https://www.acnur.org/portugues/
https://www.gov.br/dnit/pt-br/assuntos/portais-tematicos/br-319-am-ro/noticias/16-de-marco-e-o-dia-nacional-de-conscientizacao-sobre-as-mudancas-climaticas
VEIGA, José Eli, O Antropoceno e a ciência do sistema Terra, Editora 34, 2019.

Para conhecer mais sobre a Exortação Apostólica Laudate Deum https://www.youtube.com/watch?v=E3wBW31M98s

Leia outras notícias