Assunção de Maria: um testemunho de louvor ao “Deus dos Vivos”

Assunção de Maria: um testemunho de louvor ao “Deus dos Vivos”

A forma icônica da assunção de Maria se baseia na ideia de que, tendo terminado o curso de sua vida terrestre, ela foi “elevada aos céus”, no seu realismo morfológico mais evidente.

Fr. Jonas Nogueira da Costa, OFM

Muitas pessoas, quando olham para a questão da Assunção de Maria, se perguntam pela chave escatológica em que o dogma se encontra. Dizemos “chave escatológica” porque a compreensão do que significa o destino final de todo ser humano goza de diferentes compreensões teológicas, tanto se pensado a partir da história da teologia, quanto nos dias de hoje.

Atualmente, temos duas grandes vertentes que sintetizam a escatologia. A primeira fala-nos de que, na morte, acontece um juízo particular e que a pessoa aguarda o juízo final. A segunda vertente entende que, na morte, a pessoa entra numa situação de ausência de tempo e espaço, o que implica que não há nada a se esperar, logo, na morte se dá a ressurreição da pessoa e o juízo fundamental diante do Cristo.

A segunda vertente escatológica, ao afirmar uma “ressurreição da carne” na hora da morte, quando aplicada ao destino final de Maria, não viria a invalidar a singularidade da Assunção de Maria? O que há de particular em dizer que Maria foi assumida na glória celeste em corpo e alma quando o destino de toda a pessoa é a ressurreição?

Vejamos o texto mariológico mais significativo sobre a Assunção de Maria, que é a Bula Munificentissimus Deus[1], do Papa Pio XII, dada em 1º de novembro de 1950.

O texto dogmático consiste numa lógica reunião de testemunhos em favor da Assunção de Maria, compreendidos como petições à Santa Sé, como o parecer dos bispos que foram consultados e como testemunhos provenientes da patrística, da teologia em suas diferentes fases históricas, da liturgia e das Sagradas Escrituras. Encerrando a Bula temos a definição dogmática propriamente dita, afirma que

para aumento da glória da sua augusta mãe, e para gozo e júbilo de toda a Igreja, com a autoridade de nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados apóstolos s. Pedro e s. Paulo e com a nossa, pronunciamos, declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que: a imaculada Mãe de Deus, a sempre virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial.

Muitas vezes entende-se a expressão “assunta” não em seu sentido verdadeiro, mas na forma icônica que foi utilizada para apresentar o inefável mistério teleológico na vida de Maria.

A forma icônica da assunção de Maria se baseia na ideia de que, tendo terminado o curso de sua vida terrestre, ela foi “elevada aos céus”, no seu realismo morfológico mais evidente. “Elevada” enquanto retirada da morte e erguida para o céu, em um lugar que não se sabe onde é, mas que fica junto a Deus. Essa forma icônica é a que de diferentes maneiras orienta os testemunhos apresentados na Bula e que nos permite aproximar do mistério do destino final de Maria.

Nesse sentido, a forma icônica se coloca a serviço de uma compreensão mais profunda do destino final de Maria a partir da palavra “assunção”. O termo nos indica que Maria foi assumida na glória de Deus, pela ressurreição de Jesus. Ou seja, a “potência da ressurreição” de Jesus (Fl 3,10), que alcança a todos na hora de nossa morte, incidiu sobre Maria de modo pleno e singular. 

De modo pleno porque não são aspectos da vida de Maria que são assumidos pela glória de Deus, mas a totalidade da pessoa Maria de Nazaré que se deixou atingir pela “potência de ressurreição de Jesus”. E de modo singular porque a força da ressurreição de Jesus em nós, na hora de nossa morte, não descarta quem fomos em virtude do que nos tornamos na eternidade. Somos “plenificados” na vida eterna com nossa história singular, de modo que, podemos dizer que Maria é inteiramente glorificada, na singularidade de seu corpo de mulher, na singularidade de sua maternidade messiânica ao lado de José, e em tudo o que a fez ser “Maria”.  

Crer que a ressurreição na morte é para todos não contraria o pressuposto de que as singulares histórias de cada ser humano são assumidas de modo particular. Logo, cremos que Maria é recebida, pelo mistério de sua assunção à glória, como a mais fiel testemunha do poder de transformação escatológica operada pela graça do Ressuscitado e na força do Espírito Santo. Isso de modo paradigmático e em comunhão com toda a humanidade.

Dessarte, a assunção de Maria não é um arcaísmo escatológico (muito pelo contrário!), pois corrobora, de modo mais excelso, na afirmação de que Jesus Ressuscitado venceu todo o poder destruidor que a morte exercia sobre nós, reforçando nossa esperança naquele que é o “Senhor dos vivos, não dos mortos, pois para Ele todos vivem” (Lc 20,38).

Foto: Banco de imagens gratuito – Cathopic.


[1]https://www.vatican.va/content/pius-xii/pt/apost_constitutions/documents/hf_p-xii_apc_19501101_munificentissimus-deus.html 

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