São João Batista: o último profeta e o precursor do Cordeiro

São João Batista: o último profeta e o precursor do Cordeiro

Uma das mais belas e profundas declarações de João Batista se encontra no Evangelho segundo João: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1,29).

Frei Maicon Custódio, OFM

A figura de São João Batista ocupa um lugar central na história da salvação. Ele representa a culminância do Antigo Testamento e a ponte para o Novo, assumindo a missão singular de preparar o caminho do Senhor (cf. Mt 3,3). Sua vida, marcada por um ascetismo radical, sua atuação profética e sua humildade diante do Messias revelam um testemunho profético de altíssimo valor teológico.

Desde o início, a vida de João Batista é envolta por um sentido de consagração total a Deus. Nascido de Zacarias e Isabel, em idade avançada, sua existência já é um sinal de graça e intervenção divina (cf. Lc 1,5-25). Ele vive no deserto, numa atitude de separação do mundo para se consagrar exclusivamente ao Senhor. Mateus relata que ele vestia-se com pele de camelo e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre (cf. Mt 3,4), sinal de sua vida austera e desapegada.

A tradição patrística e teológica sempre reconheceu em João uma figura de eremita, cuja vida no deserto remete à purificação e à escuta da Palavra de Deus. Segundo Jean Daniélou, “a vida de João no deserto manifesta a necessidade de afastamento para o encontro com Deus e para preparar-se à missão profética” (DANIÉLOU, 1971, p. 89).

João Batista é considerado o último profeta da antiga aliança e o precursor imediato do Messias. Ele encerra o ciclo profético iniciado com Elias, a quem a tradição o compara (cf. Ml 3,23; Mt 11,14). O próprio Jesus afirma: “Entre os nascidos de mulher, não surgiu ninguém maior do que João Batista” (Mt 11,11). No entanto, o mesmo Jesus completa dizendo que “o menor no Reino dos Céus é maior do que ele”, indicando a transição que João representa: ele é a aurora que anuncia o sol da nova aliança.

A missão de João era preparar os corações para a vinda do Salvador, conclamando o povo à conversão por meio do batismo no Jordão. Era um batismo de penitência (cf. Lc 3,3), uma disposição interior para acolher o Reino de Deus que se aproximava. Seu ministério se caracteriza pelo anúncio da justiça e pela denúncia dos pecados, inclusive dos poderosos, como Herodes, a quem não temeu repreender (cf. Mc 6,17-20).

Karl Rahner comenta que João é “o profeta limiar” que permanece na fronteira entre as promessas e sua realização. Em seu testemunho, “o Antigo Testamento aponta para o Novo, e o cumprimento se aproxima” (RAHNER, 1977, p. 318).

Uma das mais belas e profundas declarações de João Batista se encontra no Evangelho segundo João: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (Jo 1,29). Aqui, João mostra toda a sua consciência profética e sua humildade. Ele não se coloca no centro; não deseja ser confundido com o Messias. Quando interrogado se era o Cristo, respondeu categoricamente: “Eu não sou o Cristo” (Jo 1,20).

João compreende que sua missão não é ocupar o lugar de Deus, mas conduzir os outros a Ele. “É necessário que Ele cresça e que eu diminua” (Jo 3,30), diz, reconhecendo o advento do verdadeiro Salvador. Ele não é a luz, mas veio para dar testemunho da luz (cf. Jo 1,8). Assim, sua figura se torna um ícone da verdadeira humildade e da missão eclesial: apontar para Cristo, não para si.

No contexto teológico, João é identificado como o “amigo do esposo” (Jo 3,29), aquele que escuta e se alegra com a voz do Esposo. Esta imagem nupcial, profundamente bíblica, remete à relação entre Deus e seu povo, que agora se realiza plenamente em Cristo, o Esposo da Igreja.

Joseph Ratzinger reforça a ideia de que João Batista é o modelo do verdadeiro profeta, cuja missão é “diminuir para que o Outro apareça” (RATZINGER, 2007, p. 269). Em João, a profecia alcança seu clímax ao indicar, com clareza e humildade, o Cordeiro definitivo, Jesus Cristo.

São João Batista é um modelo de profeta, discípulo e servidor. Sua vida austera, sua coragem profética e sua humildade diante do Cristo revelam a grandeza espiritual de quem compreendeu sua missão e a cumpriu até o fim, mesmo ao custo da própria vida. Ele nos ensina que o verdadeiro chamado cristão não é ocupar o centro, mas preparar o caminho para o Senhor. Em João, encontramos o paradigma daquele que serve à verdade e anuncia o Reino sem buscar glória própria, mas apontando sempre: “Eis o Cordeiro de Deus”.

Referências:

BÍBLIA SAGRADA. Tradução da CNBB. São Paulo: Edições CNBB, 2008.

DANIÉLOU, Jean. Os Evangelhos da Infância. São Paulo: Loyola, 1971.

RAHNER, Karl. Curso Fundamental da Fé. São Paulo: Paulus, 1977.

RATZINGER, Joseph. Jesus de Nazaré: Do Batismo no Jordão à Transfiguração. São Paulo: Planeta, 2007.

Foto: foto free Internet

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