Vocações, Carismas e Ministérios em chave sinodal (II Parte)

No segundo domingo celebramos a vocação à paternidade. No contexto atual, queremos refletir sobre esta vocação à luz da sinodalidade.

Segundo domingo – A vocação à paternidade

Frei Oton Júnior, ofm

Como vimos na reflexão anterior, o Sínodo, cuja primeira sessão se dará em outubro próximo, não quer tratar de temas específicos, entendidos de forma isolada, mas convida todo o conjunto da Igreja para repensar sua vida e missão de um modo mais participativo e corresponsável pelo anúncio do Reino de Deus.

Desse modo, é possível considerar não só os ministérios constituídos da Igreja e lê-los em perspectiva Sinodal, mas também incluir cada vocação sob a ótica de um caminhar juntos, como discípulos e discípulas do Ressuscitado.

No segundo domingo de agosto, dedicamos nossas orações e homenagens aos pais. Bem sabemos das muitas modificações que as famílias vêm passando nas últimas décadas. Novas configurações familiares vão trazendo novas formas de considerar a relação entre pais e filhos. O próprio lema escolhido para o Sínodo já indica para uma realidade aberta: “alarga o espaço da tua tenda” (Is 54,2).

Ao longo da vida, vamos ganhando também outros pais, para além dos vínculos biológicos, pessoas que nos indicam o caminho, nos apoiam, nos corrigem. Tornamo-nos igualmente pais de tantos outros, para além do DNA. Esta é a teia da vida. É como reflete a Conferência Episcopal do Zimbabwe “devemos também prestar atenção aos pensamentos e às ideias da família alargada e dos companheiros de viagem (não católicos, políticos, não crentes). Há vozes ao nosso lado que não podemos permitir-nos ignorar, se não queremos perder quanto Deus está a segredar através deles” (DEC 54).

Na Exortação Amoris Laetitia (2017), o Papa Francisco já relembrava esta realidade a respeito de uma nova consideração da figura do pai:

“Diz-se que a nossa sociedade é uma ‘sociedade sem pais’. Na cultura ocidental, a figura do pai estaria simbolicamente ausente, distorcida, desvanecida. Até a virilidade pareceria posta em questão. Verificou-se uma compreensível confusão, já que, num primeiro momento, isto foi sentido como uma libertação: libertação do pai-patrão, do pai como representante da lei que se impõe de fora, do pai como censor da felicidade dos filhos e impedimento à emancipação e à autonomia dos jovens. Por vezes, havia casas em que no passado reinava o autoritarismo, em certos casos até a prepotência. Mas, como acontece muitas vezes, passa-se de um extremo ao outro. O problema nos nossos dias não parece ser tanto a presença invasora do pai, mas sim a sua ausência, o fato de não estar presente. Por vezes o pai está tão concentrado em si mesmo e no próprio trabalho ou então nas próprias realizações individuais que até se esquece da família. E deixa as crianças e os jovens sozinhos. A presença paterna e, consequentemente, a sua autoridade são afetadas também pelo tempo cada vez maior que se dedica aos meios de comunicação e à tecnologia da distração. Além disso, hoje, a autoridade é olhada com suspeita e os adultos são duramente postos em discussão. Eles próprios abandonam as certezas e, por isso, não dão orientações seguras e bem fundamentadas aos seus filhos. Não é saudável que sejam invertidas as funções entre pais e filhos: prejudica o processo adequado de amadurecimento que as crianças precisam de fazer e nega-lhes um amor capaz de as orientar e que as ajude a maturar” (AL 176).

Ler a vocação à paternidade em perspectiva sinodal traz à cena a escuta e a atenção aos membros da família, o exercício dessa função como um serviço pelo bem dos outros, o reconhecimento de seu lugar no ambiente familiar e também suas limitações.

O Instrumentum Laboris do Sínodo ressalta o valor do diálogo, em todos os ambientes. Consideremos aqui o ambiente familiar: “Em seu sentido etimológico, o termo ‘diálogo’ não indica uma troca genérica de ideias, mas uma dinâmica na qual a palavra pronunciada e ouvida gera familiaridade, permitindo que os participantes se aproximem uns dos outros” (IL 33). Desse modo, há que se promover o diálogo real e sincero nas famílias, em que cada um se sinta à vontade para dizer de si e se disponha igualmente a ouvir seus familiares.

Ao celebrarmos a vocação de nossos pais, pedimos que o Espírito os ilumine, os conduza, sempre de um modo serviçal, ouvintes da Palavra do Senhor e ouvintes de suas famílias. Assim teremos famílias sinodais, em que o amor circula de forma leve e prazerosa.

Referências

CELAM, Síntesis de la Fase Continental del sínodo de la sinodalidad en América Latina y el Caribe, 2023.

FRANCISCO,  Exortação Amoris Laetitia, 2017.

XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, Instrumentum Laboris para a Primeira Sessão (Outubro de 2023).

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